“Minha consciência, por conseguinte é capaz de mover-se através de diferentes esferas da realidade. Dito de outro modo, tenho consciência de que o mundo consiste em múltiplas realidades. Quando passo de uma realidade a outra experimento a transição como uma espécie de choque. Este choque deve ser entendido como causado pelo deslocamento da atenção acarretado pela transição. A mais simples ilustração deste deslocamento é o ato de acordar de um sonho”.

Peter Berger e Thomas Luckmann

O advento da internet propiciou a difusão da comunicação à distância criando novos hábitos e uma maneira diferenciada de enxergar a realidade. Os jovens da atualidade não se imaginam sem um computador, ao passo que seus avós e os pais de alguns mal entendem o funcionamento desta máquina. Se antes o comum era conhecer alguém pessoalmente e, aos poucos, trocar informações sobre gostos, histórias pessoais, hoje o oposto acontece. Por meio da grande rede indivíduos “se encontram”, trocam informações e, se gostarem da conversa, finalmente se conhecem face a face. Esta etapa do novo processo de comunicação tem como finalidade confirmar no real fatos ocorridos virtualmente.

A Internet é simultaneamente real e virtual (representacional), informação e contexto de interação, espaço (site) e tempo, mas que altera as próprias coordenadas espaço-temporais a que estamos habituados, compactando-as, ou seja, o espaço e o tempo na rede existem na medida em que são construções sociais partilhadas. Esta nova construção é estruturada pelos laços e valores sociopolíticos, estéticos e éticos que tipificam este novo espaço antropológico[1].

Para muitos, real e virtual se distanciam e criam “abismos sociais”, para outros, estes dois conceitos andam cada vez mais juntos, “caminhando” para se tornarem um só. As barreiras que distinguem esses mundos ficam cada vez mais imperceptíveis. A resistência em relação ao virtual talvez exista devido à insegurança que causa em alguns. “A realidade que era tomada como inegável em si, torna-se suspeita de ser mera criação, mera aparência, mero correlato de consciência ou para usar outra expressão: mera construção”[2].

É o que acontece com Thomas Anderson ao tomar consciência da existência do Matrix. Uma verdadeira confusão mental ocorre até que o protagonista se localize em seu novo tempo e espaço. Não seria exagero comparar a sociedade atual à Anderson no momento em que descobre o que se passa do outro lado da tela do computador. Aqueles que venceram a resistência e se integraram ao mundo virtual “vivem” parte de seu tempo nele e o tomam como tão real quanto o mundo em que nasceram.

Talvez porque ao entrar no ciberespaço o indivíduo de fato nasça outra vez. No Matrix, Anderson era mantido em uma espécie de encubadora na qual estava imerso em um líquido semelhante à placenta humana. Ao acordar, a encubadora se rompe e ele, como um recém-nascido, olha com estranhamento tudo ao seu redor. Na medida em que vai conhecendo a “nova realidade”, se torna mais seguro e acredita nela tanto quanto naquele mundo que antes considerava real.

Outra analogia feita em relação à entrada do indivíduo no mundo virtual é a do rito de passagem. Para André Lemos, este momento pode ser visto como um “evento que marca a mudança do indivíduo ou de um grupo, para um outro estado, seja ele biológico ou social”[3]. De acordo com o autor, o “ciberespaço pode ser compreendido como um rito de passagem da era industrial à pós-industrial, da modernidade dos átomos à pós-modernidade dos bits”[4]. Lemos compara ainda a conexão à internet aos ritos de agregação e separação. Assim como o espelho de Alice, a tela do computador tem a função de separar real e virtual. Ela funciona como o meio através do qual o indivíduo se insere em um outro mundo. Um mundo que se torna cada vez mais real para quem dele faz parte.

Real e virtual se aproximam cada vez mais. Mundos paralelos convivem pacificamente. Ao que tudo indica Platão não estava enganado quando criou o “Mito da Caverna”. A virtualização de relações (re) aproxima indivíduos separados pelo espaço físico, mas que se encontram no mesmo tempo: a Era da Revolução Tecnológica. Afinal, como afirma Gottfried Stockinger

a internet como ambiente não apenas amplifica a formação de campos de comunicação social enquanto 'instrumentos': ela é capaz de fazer emergir construções culturais e sociais inéditas, que se transformam praticamente em sujeito, ganham 'vida' própria, uma vida virtual equipada com inteligência artificial[5].

E que abre caminhos para que se torne real.



[1] SILVA, Lígia Oliveira. In: LEMOS, André, PALACIOS, Marcos, 2001. 151p.

[2]STOCKINGER, Gottfried, In: LEMOS, André, PALACIOS, Marcos, 2002. p.117.

[3]LEMOS, André, 2004. p. 132.

[4]Idem.

[5] STOCKINGER, Gottfried. In: LEMOS, André, PALACIOS, Marcos. 2001, p. 208.


Texto extraído da Monografia de Ana Cláudia Mendes Santos. Graduada em Comunicação Social - Jotnalismo pela Universidade Federal de Viçosa

1 Comment:

  1. Jonas said...
    Muito interessante seu site e as colocações que fez.
    Desenvolvo pesquisas a respeito da internet e a Comunicação.
    E, este blog, me ofereceu informações que até o momento ainda não tinha pensado.
    Vou acompanhar!

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